segunda-feira, 7 de junho de 2010

Os novos emigrantes

Fui contactado pela jornalista Fátima Mariano do JN/DN para conceder uma entrevista sobre a nova emigração. 


A peça saiu ontem, 6 de Junho e tem como titulo "Emigração portuguesa está mais qualificada":

Jovens quadros técnicos e científicos optam cada vez mais por fazer carreira no estrangeiro, devido às melhores oportunidades e salários.
Substituíram a mala de cartão por uma mala com rodinhas; já não passam a fronteira a pé, mas sim de avião; em vez de escreverem longas cartas a falar da nova vida e das saudades da família ou de fazerem curtos telefonemas de tempos a tempos, comunicam através das redes sociais, dos programas de conversação instantânea ou por telemóvel. Eis os novos emigrantes portugueses.
Num artigo publicado no anuário "Janus 2008", Helena Rato, investigadora do Instituto Nacional de Administração, descreve desta forma o novo cenário da emigração nacional: "verifica-se uma tendência ao aumento da população emigrante com menos de 29 anos de idade, enquanto que o ritmo de emigração da população mais velha tende a manter-se constante; a taxa de crescimento da emigração permanente é superior à da emigração temporária; na emigração permanente, verifica-se uma quase paridade entre os dois sexos, enquanto que a emigração temporária permanece essencialmente masculina; a emigração de trabalhadores qualificados tende a crescer mais do que a dos trabalhadores não qualificados".
Os portugueses que actualmente emigram já não o fazem com "uma mão à frente e outra atrás", refere a socióloga Margarida Marques, nem em "debandada", como dizia Orlando Ribeiro. "Esse Portugal já não existe", sublinha a mesma investigadora. Actualmente, são sobretudo jovens quadros técnicos e científicos que procuram oportunidades de enriquecimento profissional, o que também reflecte "a evolução do país", diz.
Tânia Cunha, de 27 anos, natural de Batocas (concelho do Sabugal), é licenciada em Matemática Aplicada e Computação pela Universidade de Aveiro e vive, desde Junho de 2007, em Madrid. Após o estágio profissional, em Aveiro, recebeu uma proposta de trabalho de uma empresa espanhola. Apesar de também ter tido propostas para ficar em Portugal, decidiu aceitar e diz não estar arrependida. As outras propostas eram "pouco ambiciosas face à proposta da consultora espanhola", explica.
Também Nuno Oliveira, de 25 anos, natural de Vila Branca, concelho de Albergaria-a-Velha, mudou-se para Genebra à procura de "uma boa oportunidade de carreira". Vive na Suíça desde Novembro de 2008, altura em que iniciou um estágio tecnológico no CERN - Laboratório Europeu de Física das Particulas, um "local único", como o próprio descreve.

Uma questão de sobrevivência
Margarida Marques sublinha que o mais correcto não é falar-se em novos emigrantes, mas sim de novas categorias de migrantes. Além dos que saem do país por uma questão de sobrevivência, há também os que "saem porque a multinacional em que trabalham lhes dá a possibilidade de irem para outro país ou os que saem à boleia de programas europeus, de bolsas de estudo ou de investigação".
Não foi esse o caso de Ricardo Taipa, de 37 anos, natural de Lisboa. Viveu um ano na Polónia em 2001, ao abrigo do programa europeu Eramus. Ali conheceu a mulher, uma polaca, com quem regressou a Portugal. Aqui viveram entre 2002 e 2004, mas "todos os factores conjugados pareciam empurrar-nos para fora", desabafa. As "poucas perspectivas de ter um emprego bem remunerado, do desemprego" e do facto de a mulher não poder ter visto de residência (na altura, a Polónia não pertencia à União Europeia), levaram o casal a regressar à Polónia.
Actualmente, Ricardo Taipa é consultor informático na Fujitsu Technological Solutions em Lodz, a segunda maior cidade polaca. Afirma que nunca teve ensejo de deixar Portugal, "um país fantástico e realmente bonito", mas onde a única solução de vida que tinha era a de "endividar-se até ao tutano".
Este consultor informático diz que a Polónia "está longe de ser o ideal de país para viver" e, por isso, não afasta a hipótese de emigrar com a mulher, Paula, e os dois filhos entretanto nascidos, Manuel de quatro anos, e o Marcel, com um ano e meio. Portugal está, definitivamente, de parte, pois aqui "só se vive na plenitude com bastante dinheiro no bolso", lamenta.
Margarida Marques chama a atenção para o facto de haver um conjunto de países com economias emergentes, como os do continente africano ou asiático, onde há muito ainda por fazer e falta mão-de-obra qualificada. Dá o exemplo de Angola, onde estão perto de 75 mil emigrantes portugueses, e "que precisa de tudo, desde médicos a professores, pessoal da construção civil a engenheiros".

Empreendedorismo dos emigrantes
José Marques, professor-adjunto da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Leiria, prefere falar em mobilidade mais do que em migração, visto ser cada vez mais comum as saídas de duração limitada para realizar trabalhos específicos, por um lado, e porque muitos emigrantes qualificados acabam por se mudar de um país para outro com grande rapidez.
À semelhança de Ricardo Taipa, também Tânia Cunha não coloca de parte voltar a emigrar. "Não descarto a possibilidade de emigrar para outro país. Viver e trabalhar noutro país continuaria a ser um contributo importante para o meu crescimento profissional e pessoal", diz.
Este investigador está a desenvolver um estudo sobre "Empreendedorismo transnacional dos emigrantes portugueses", uma área pouco estudada no país. Na apresentação do trabalho, explica que "estudos de vários países têm demonstrado que o auto-emprego e o empreendedorismo migrante têm funcionado em diversos contextos como uma nova via de acesso ao mercado de trabalho dos países de acolhimento".
Embora o estudo esteja no início e se cinja à comunidade portuguesa radicada na Suíça, José Marques referiu que "os empresários nacionais têm aproveitado os emigrantes empreendedores para vender os seus produtos fora do país".
A este propósito, Nuno Oliveira diz que o "preocupa bastante a situação das empresas portuguesas", que não considera "competitivas". "Temos uma carga fiscal elevada e recursos humanos pouco qualificados, o que leva a baixa produtividade e produtos com pouco valor acrescentado". Diz que "seria necessário apostar na formação real de qualidade (a nível técnico e superior), investir em I&D e reduzir os encargos a nível de impostos das empresas".

Fuga de cérebros?
Há quem classifique este movimento emigratório de quadros qualificados como uma "fuga de cérebros", com tudo o que de negativo tal implica para o desenvolvimento de Portugal, mas Margarida Marques recusa esta lógica de pensamento. "A realidade migratória é altamente dinâmica, está sempre em movimento. Isto é extremamente positivo e é bom que os portugueses sem apreciados e reconhecidos no exterior", refere a investigadora do Gabinete de Investigação em Sociologia Aplicada da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH/UNL).
Nuno Oliveira partilha da opinião: "Só quem nunca saiu de Portugal pensa que não temos valor. Estamos em pé de igualdade com os nossos colegas europeus, apenas precisamos de um sistema a funcionar e que retire o melhor dos nossos recursos", conclui este investigador do CERNE.
Apesar de o fenómeno emigratório ser bastante flutuante, não há, em Portugal, dados quantitativos que permitam fazer estudos mais profundos sobre estes novos emigrantes. Desde 2003 que o Instituto Nacional de Estatísticas deixou de coligir estes dados e o Observatório da Emigração, criado em 2008, encontra-se ainda a recolher indicadores estatísticos.

Deixo também a entrevista na integra, visto que não apareceu na totalidade:
1 - Gostaria de saber a sua idade, naturalidade e percurso académico.
Tenho 25 anos, sou da Vila da Branca (distrito de Aveiro) e licenciei-me como Engenheiro Mecânico em 2007 pela Universidade de Aveiro. Trabalhei durante 1 ano em Portugal tendo vindo depois para a Suíça.

2 - Desde quando vive na Suíça e por que decidiu ir?
Estou na Suíça desde Novembro de 2008 ao abrigo de um programa de estágios tecnológicos entre o CERN - Laboratório Europeu de Física das Partículas e a ADI - Agência de Inovação. Decidi vir para cá porque era uma boa oportunidade de carreira para um jovem licenciado como eu e porque o CERN é um local único, com tecnologia de ponta e que me ia possibilitar uma experiência internacional e multicultural.

3 - Foi sempre seu desejo viver/trabalhar fora de Portugal ou tratou-se de uma necesidade?
Saí do país não por necessidade mas porque sempre quis ter uma experiência internacional. Sempre achei que viver e trabalhar com outras culturas e mentalidades seria importante não só em termos profissionais, mas também pessoais. Se não o tivesse feito seria algo que me ia ficar a faltar.

4 - Conhecia alguém na Suíça que tenha ajudado na sua integração?
Houve um casal amigo dos meus pais que me ajudaram bastante na integração. Mantemos o contacto de uma forma constante e têm sido um óptimo suporte.

4 - Foi difícil a adaptação a um novo país, a uma nova forma de estar na vida e no trabalho?
O início não foi fácil, deixar para trás família, namorada, amigos e conforto do nosso país custa mais do que pensamos. Mas penso que me adaptei muito bem ao novo país, estou num local que existe muita qualidade de vida e o trabalho mesmo sendo exigente deixa-nos tempo livre para outras actividades. Neste ponto senti muita diferença de Portugal em que se trabalha muitas horas, muitas vezes não tendo um aumento de produtividade como seria de esperar.

5 - Que visão tinha da vida dos emigrantes antes de partir para a Suíça e que visão tem agora?
Antes de partir pensava que os emigrantes vivam em condições menos boas, trabalhavam muitas horas e poupavam o máximo que podiam. Quando aqui cheguei vi que não era assim, pelo menos de uma forma geral. É normal que havendo muitos emigrantes mais velhos tenham hábitos diferentes dos emigrantes mais novos. Os emigrantes que mais lido de meia idade já viajam, aproveitam a cultura, têm vida social, etc.

6 - Vai continuar a viver na Suíça? Gostaria de trabalhar/viver noutro país? Qual?
O futuro neste momento ainda não é claro. O meu estágio acaba dentro de uns meses e preciso definir o próximo passo. Diria que existe uma grande probabilidade de voltar a Portugal, sempre foi o meu desejo, mas estou atento a oportunidades que existam noutros países, mas com a preferência de um país europeu evoluído.

7 - Com que frequência vem a Portugal e o que pensa da situação sócio-económica do país?
Vou frequentemente a Portugal, pelo menos uma vez por mês. É sabido que a situação sócio-económica de Portugal é preocupante. Temos uma dívida pública muito grande, que será paga com o aumento dos impostos e não pela redução da despesa como deveria ser o caminho, com todas as implicações que isso tem no mercado. Pessoalmente preocupa-me bastante a situação das empresas portuguesas, de uma forma simples, as nossas empresas não são competitivas. Temos uma carga fiscal elevada e recursos humanos pouco qualificados, o que leva a baixa produtividade e produtos com pouco valor acrescentado. Seria necessário apostar na formação de real qualidade (a nível técnico e superior), investir em I&D e reduzir os encargos a nível de impostos das empresas. Contudo estou optimista, só quem nunca saiu de Portugal pensa que não temos valor. Estamos em pé de igualdade com os nossos colegas europeus, apenas precisamos de um sistema a funcionar e que retire o melhor dos nossos recursos.

7 comentários:

Ricardo disse...

As entrevistas na integra têm sempre mais sumo. Aproveita enquanto és solteiro (não quero saber se és bom rapaz ou não) e viaja por essa Europa, por esse mundo. Com o CERN no CV tens com certeza muitas oportunidades.

Quem sabe se ainda te lemos no blogue A minha experiência nos EUA!

ab

f_mg disse...

é sempre bom saber que há portugueses até no CERN
parabéns

DaJe disse...

Très bien monsieur!

Cidchen disse...

Gostei de ler a entrevista. Eu própria ando a escrever um livro sobre a minha própria vinda para este país helvético. Anos passaram, e muitas coisas mudaram.A emigração já não era como antes, felizmente.

Tal como tu, o meu desejo também é voltar para Portugal, mas... a ver vamos. :P

Unknown disse...

Bom post!
Como vão as coisas aí por GE rapaz?
abraço

Mário Rui Luzeiro disse...

Força aí Nuno! Make your best next move! :P []

Unknown disse...

Sou o Fábio tenho 20 anos estou com muitas dificuldades económicas somos um agregado familiar com 3 (mãe, irmã e eu) só com o abono de escola da minha irmã + pequena reforma da minha mãe no valor de 302 euros. minha irmã estuda no 12 ano. meu pai abandonou minha mãe em Julho de 2012 cortando contactos com a gente devido aos problemas mentais tendo esquizofrenia indo morar para casa duma irmã (minha tia) em Alcochete e nós somos da zona de santo Tirso . Devido à conjuntura familiar e do país estou com a ideia de emigrar, porque aqui não consigo encontrar trabalho (farto-me de mandar currículos e fazer fichas de candidatura de empregos e até ao momento nada). Já estive no Luxemburgo 2 meses em remich que faz fronteira coma Alemanha , fazendo uns biscatos. meus pais já estiveram na suíça , concretamente em sisikon a trabalhar no hotel tellsplatte e em altdorf no cantão uri . Tenho o 11º ano e tenho a necessidade de emigrar para qualquer país Suiça , Luxemburgo, França,Alemanha , Bélgica) estes de preferência Por favor se alguém souber de alguma oportunidade de trabalho seja estufas, construção , hotelaria, qualquer coisa me contactem procuroempregourgente@hotmail.com